[Entrevista] Where’s My Bible: “Eu acho que facilita pegar essas emoções e colocar na música porque a beleza disso é que esses momentos sombrios também nos dão esperança”
Em entrevista para o Tramamos, o vocalista Jussi Matilainen, nos contou sobre o início da banda, a decisão de mudar o estilo, o novo álbum Kave e como foi estar no Brasil
Where’s My Bible é uma banda finlandesa de death/black metal que surgiu em 2016. Porém, inicialmente, a banda seguia um estilo mais hard rock e totalmente diferente do que conhecemos agora. A mudança para o Black Metal surgiu anos depois com a composição do EP Circle.
Para falar sobre o segundo álbum chamado Kave, a influência da Finlândia em suas músicas e como foi estar no Brasil através do projeto Come to Latin America, conversamos com o vocalista Jussi Matilainen e você confere abaixo:
Eu gostaria de começar falando um pouco sobre o início da banda. Vocês começaram em 2016. De onde veio esse desejo de montar a banda?
Jussi: Quando começamos a fazer música, no começo, nós só queríamos nos unir e tocar. Em certo momento, vimos que a gente deveria fazer isso mais seriamente e termos mais poder em nosso trabalho.
Foi muito rápido quando sentimos que deveríamos levar a sério, mas na época nós queríamos que as músicas tivessem um humor. Então no começo, no primeiro álbum, por exemplo, tem um pouco de humor nele. Porém, depois disso, decidimos fazer músicas mais sombrias e profundas. Mais Black Metal.
Para nós, foi uma boa escolha fazer aquelas músicas antigamente, mas o estilo que temos agora é muito mais fácil para compor e vem da alma.
Eu não sei se respondi a sua pergunta.
Sim, claro, é até umas das minhas perguntas. O primeiro álbum é muito diferente do segundo que está sendo lançado agora. O primeiro tem uma pegada mais hard rock enquanto o segundo é bem black metal.
Jussi: É quase como uma outra banda com um gênero diferente.
Foi algo que vocês perceberam com o tempo, durante as composições? Ou foi uma decisão formada de mudar de estilo?
Jussi: Eu acho que veio naturalmente para nós. Foi um pouco antes da pandemia quando a gente lançou o single Werewolves of Ghost Town, eu acho que esse foi o novo passo para a nossa música. E reflete no que estamos fazendo hoje.
Quando a pandemia afetou o mundo inteiro e fomos forçados a repensar algumas coisas e o que deveríamos fazer dali para frente, então a gente decidiu começar tudo de novo e fazer algo que é mais parecido com a gente.
E essas inspirações para compor as letras? Eu sei que muita coisa vem da cultura finlandesa, como é esse processo e a inspiração para as músicas?
Jussi: Eu amo a natureza e tudo que há nela porque eu acredito que, de certa forma, eu sou um animista (acreditar que todas as coisas têm um espírito). Então é muito fácil de escrever sobre coisas da natureza.
O que é muito interessante para mim é a mente humana e como você pode criar várias coisas com o pensamento, mas você também pode se destruir.
São muitas coisas que amamos na banda. Quando a gente começou a fazer o primeiro capítulo de Circle, a gente queria que fosse como um curta-metragem.
Decidimos fazer sobre todas as estações que temos aqui na Finlândia para os clipes. Meio que começou daí a ideia de misturar a natureza com a música.
Isso é muito legal porque há alguns meses eu entrevistei o Wintersun…
Jussi: Ah! (surpreso)
E ele estava falando como as estações finlandesas influenciavam a sua música, principalmente o inverno. Nesse álbum vocês falam sobre a escuridão profunda que é comum no inverno finlandês. Como a Finlândia influencia nas músicas de vocês?
Jussi: Eu acho que acaba enriquecendo nossa música quando compomos heavy metal porque a escuridão é muito melancólica, mas também muito bonita.
Todo esse frio e escuridão que estamos vivendo aqui nos leva a pensar em nossas emoções de uma forma diferente. Porque, é claro, no verão todos estão felizes e dançando (risos).
Porém, no inverno, somos forçados a ficar mais em casa ou quando saímos, é tudo muito escuro. A luz do dia dura algumas horas.
Eu acho que facilita pegar essas emoções e colocar na música porque a escurão do tempo é a escurão da mente, mas a beleza disso é que esses momentos sombrios também nos dão esperança.
Você acaba se conhecendo melhor e como sobreviver os seus pensamentos sombrios.
A Finlândia é muito conhecida pelo heavy metal. Como vocês veem a cena finlandesa? Como é para as bandas que estão surgindo agora?
Jussi: Eu acho que… Uma pergunta difícil!
Hoje em dia há ainda mais bandas na Finlândia, mas eu acho que é porque hoje podemos compartilhar mais a nossa música do que há 20 anos.
Também não acho que isso só aconteça na Finlândia.
E nas escolas também temos aulas de música e isso acaba fazendo parte dos finlandeses durante a nossa vida.
Isso é muito legal! Eu gostaria que a gente tivesse isso no Brasil porque nós amamos músicas, mas não temos esse incentivo. Viver de música é muito difícil aqui no Brasil.
Jussi: Eu acho que vocês deveriam ter mais escolas de música porque o Brasil tem muita musicalidade e ritmo no seu sangue.
Quando estivemos aí, eu gostei muito que eu senti a música em vocês e como é energético.
Vocês estiveram no Brasil. Como foi essa experiência? O choque cultural foi muito grande?
Jussi: Foi uma experiência extremamente incrível! Todos na banda querem voltar o mais rápido possível porque foi muito memorável.
O público foi incrível, talvez o melhor que já tivemos. Eu amo o público finlandês, eles curtem bastante o show, mas quando chegamos no Brasil, foi como um novo mundo.
Depois disso, quando voltamos para a Finlândia para tocar uma semana depois do Brasil, foi: “Caramba, essas pessoas não fazem nada durante o show”. (risos)
A gente já começou a falar sobre, mas eu queria falar um pouco mais sobre o novo álbum. Primeiro, eu digo o nome com um sotaque mais inglês ou no sotaque finlandês.
Jussi: Kave! (com sotaque finlandês). É uma palavra finlandesa antiga.
Eu vi um comentário do guitarrista Pasi Löfgren falando que vocês tiveram uma certa pressão para terminar o álbum. E o baixista Juho Jokimies disse que vocês tiveram um rápido processo de composição depois da turnê pela América do Sul. Foi algo natural para vocês, você acha que algo acabou faltando para esse álbum ou ele conseguiu expressar exatamente o que vocês queriam para ele?
Jussi: A gente tinha a ideia do que iríamos fazer, também tínhamos algumas canções, mas nenhuma completa.
A gente não teve muito tempo para fazer o álbum todo porque algumas gravadoras disseram que eles queriam o álbum masterizado rapidamente.
A gente ficou: “Caramba, a gente vai ter que fazer isso muito rápido”. (risos)
Porém foi muito incrível essa experiência porque tivemos a oportunidade de aprender e ver o quão rápido a gente consegue trabalhar. Ficamos muito felizes com o resultado.
Quando a gente começou a fazer esse álbum, nosso guitarrista, Toni, perguntou se iríamos fazer um álbum conceitual. Eu disse que não sabia, dependia do processo de composição, mas talvez não. Porém, quando comecei a escrever as letras e ouvir as canções, eu vi que havia uma linha dramática e eu percebi que iria acabar sendo um álbum conceitual.
Porque há muitas histórias ali que começa quando o sol se põe, falando sobre a noite, então o sol nasce de novo.
Eu percebi isso no álbum também no instrumental que tem um certo caminho com altos e baixos e acabam trazendo uma sintonia para a música.
Jussi: Sim, obrigado!
Você usa diferentes técnicas para cantar. Como você encontra essas vozes dentro de você quando você vai gravar?
Jussi: Normalmente quando eu ouço a canção eu sinto qual parte eu quero incluir os vocais ali. Mas nem sempre soa tão bem na realidade como na sua cabeça. Então eu acabo mudando algumas coisas.
Mas eu costumo ouvir como a canção soa para mim e como ela quer que seja naquele momento.
Eu amo mudar a minha voz e brincar com ela. Eu faço isso desde criança. Por isso tem sido fácil usar essas vozes.
Vocês vieram para o Brasil com o projeto Come to Latin America e eu vi que eles querem fazer mais uma edição e trazer outra banda. Se você pudesse recomendar uma banda da Finlândia a vir para o Brasil, você tem alguma que gostaria que viesse para cá?
Jussi: Isso é muito difícil, há tantas bandas na Finlândia!
Tem uma banda de metal que surgiu na minha cabeça chamada Numento. Eles têm uma vocalista feminina que também toca instrumentos antigos finlandeses.
Eles lançaram um novo álbum há algumas semanas, eu acho, e eles são incríveis.
Seria muito legal ver eles aí!
E quais os planos para o futuro?
Jussi: Estamos trabalhando para ter mais shows ano que vem e, esperançosamente, teremos algumas turnês se tudo der certo.
Talvez alguns festivais ao redor do mundo, mas não tenho certeza ainda.
Já começamos a produzir novas músicas também. Estamos planejando ir para a natureza gravar alguns sons e antigos instrumentos para começar a misturar diferentes sonoridades para o próximo álbum.
Não pode ser mais finlandês, ir para a natureza e gravar músicas (risos).
Jussi: Sim (risos).