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Angra Acústico: Um evento de gala, uma grande produção e um show com altos e baixos

Resenha: Fernado Queiroz
Fotos: Tamira Ferreira

Em noite com casa cheia, o Angra, maior expoente do Power/Prog Metal no Brasil, faz um evento chique, com uma produção impecável, qualidade de som excelente e um palco recheado de decorações clássicas. Também contava com uma pequena orquestra, junto com o renomado percussionista Guga Machado e o pianista/tecladista Davi Jardim.

As participações especiais da fabulosa cantora Vanessa Moreno e de ninguém menos que Kiko Loureiro, ex-guitarrista e membro clássico da banda, que recentemente saiu do Megadeth.

A produção incrível foi o plano de fundo para uma apresentação com ótimo repertório, excelentes arranjos, mas uma performance irregular, em especial do vocalista italiano Fabio Lione. E em um horário que prejudicou muitos fãs após o show.

 

ANTES DO SHOW

Um show acústico de uma banda de heavy metal é sempre algo a se ficar atento. Pode ficar muito bom, ou uma bomba e temos exemplos por aí de ambos os casos. Essa incerteza, por si só, poderia ter espantado o público, mas no caso do Angra não foi o que ocorreu. E às 19h, uma hora antes dos portões do Espaço Unimed abrirem às 20h — que na verdade abriu um bocado antes —, a fila na porta já era extensa, mostrando com certeza que teríamos casa cheia.

Casa cheia que, no caso do Espaço Unimed, significa mais de sete mil pessoas, porém, para esse evento, uma boa parcela do local estaria ocupada com mesas e cadeiras, deixando o espaço total para o público em pé bem diminuto em comparação ao total comum em shows padrões.

Música clássica tocava no recinto enquanto esperávamos o show, diferente dos tradicionais rock e heavy metal em shows elétricos da banda.

Pois bem, dito e feito, às 22h, horário marcado para o começo do show — um horário muito ruim, aliás, para grande parte do público, que depende de transporte público —, a casa já estava com seu público total, e embora não fosse realmente lotado, era um ótimo número de pessoas para um evento como esse.

A APRESENTAÇÃO – UM OLHAR CLÁSSICO E TRANQUILO PARA UM GÊNERO PESADO

As primeiras notas foram ouvidas com cerca de dez minutos de atraso, e foi nada menos que o clássico Nova Era, do álbum Rebirth, sem a introdução In Excelsis. Embora em versão acústica, a adaptação ficou bem fiel e reconhecível na hora, porém com andamento mais lento.

Os músicos entraram no palco vestindo roupas sociais e sentados, com exceção do vocalista Fabio Lione, com sua tradicional camiseta apertada e calça preta com sapato. Ao começar a cantar, Lione foi quase completamente encoberto pela plateia cantando em coro a plenos pulmões, mas percebeu-se, porém, que a excelente adaptação instrumental ficou destoante da parte cantada, com o vocalista cantando muito forte em uma peça que deveria ser mais calma.

Apesar disso, a canção foi muito bem executada, só ficou faltando essa harmonia entre vocais e instrumental. O mesmo não ocorreu com Make Believe, a próxima música, outra muito querida pelos fãs, que estava em plena harmonia entre vocais e o instrumental, embora algumas pessoas não gostem da interpretação de Lione, como também acontecia quando Edu Falaschi cantava a música.

Essa sim ficou um trabalho bem primoroso de adaptação acústica e exemplos disso não faltam em apresentações gravadas disponíveis na internet.

Outra muito bem executada foi Storm Of Emotions, do álbum Secret Garden, primeiro com Fabio Lione nos vocais, a canção seguinte. A música teve boa adaptação, mas sofreu do mesmo mal de Nova Era, com a falta de coesão entre parte cantada e instrumental, e uma certa falta de interesse do público por essa canção, que demonstra que o álbum não caiu, mesmo após uma década, na preferência dos fãs.

Diferente foi o caso de Gentle Change, uma das preferidas de todos na casa, e notoriamente uma das que Fabio sempre interpretou melhor. Os backing vocals de Rafael Bittencourt foram destaque, inclusive. Em muitos shows da banda, o microfone de Rafael costuma ficar alto demais, muitas vezes ofuscando os próprios vocais principais de Lione, mas dessa vez estava tudo na medida, uma nota dez facilmente para a equipe técnica de áudio.

Como Lione disse a seguir, Bottom Of My Soul, música cantada por Rafael originalmente, no álbum Ømni, não foi muitas vezes tocada ao vivo pela banda, mas aquela ocasião acústica era perfeita, e dessa vez a escolha de colocarem Lione para cantar junto foi acertada, já que é um cantor de melhor interpretação ao vivo que Rafael, e no fim, um ajudou o outro na execução. Também não é das preferidas da maior parte do público, embora houvesse mais gente empolgada que com Storm Of Emotions.

Outra escolha muito certeira e com arranjos perfeitos foi Silence And Distance, que infelizmente até hoje ninguém conseguiu fazer jus à interpretação de Andre Matos originalmente. Não por falta de qualidade tanto de Edu Falaschi anteriormente, ou de Fabio Lione agora, mas por serem muito características do saudoso vocalista da primeira formação.

HOMENAGEM A SILVIO SANTOS, RECÉM FALECIDO

O ponto mais alto do show, porém, começaria agora! Vanessa Moreno, cantora de MPB, subiu ao palco para cantar a próxima, um single do último álbum Cycles Of Pain, também gravado por ela, a bonita Hear In The Now. A cantora parecia nervosa no começo, mas ao longo da canção se soltou, ganhou confiança e fez um trabalho incrível no fim das contas.

Neste momento, Rafael tomou o microfone para si, disse que era um momento feliz para eles, mas ao mesmo tempo estavam tristes pela morte, no mesmo dia, do apresentador Silvio Santos, lenda da TV brasileira, segundo o próprio Rafael, e fato inegável, goste você dele ou não.

Para homenageá-lo, Rafael apresentou a banda e os convidados todos tocando jingles do apresentador, como ‘agora é hora de alegria’. O público nitidamente gostou da homenagem, e aplaudiu o ato.

Em seguida, Vanessa voltou ao microfone, e foi tocada a clássica música do álbum Angels Cry, Wuthering Heights, cover da cantora britânica Kate Bush, que se tornou um símbolo da carreira e da voz do falecido Andre Matos. Vanessa soltou toda sua voz, e fez uma das interpretações mais incríveis da canção.

Finalizada a lindíssima versão da música de Kate Bush, foi tocada Tears Of Blood, novamente com Lione nos vocais, e Vanessa fez a parte de Amanda Somerville, cantora renomada do metal europeu que gravou originalmente a música do mais recente álbum, Cycles Of Pain.

A PRESENÇA MAIS ILUSTRE DA NOITE: KIKO LOUREIRO

Dificilmente você vai conhecer um ser humano vivo, fã de Angra, que não sinta falta da presença icônica de Kiko Loureiro na banda.

É verdade que Marcelo Barbosa é um guitarrista fantástico, igualmente ótimo violonista, com uma excelente presença no palco, mas o “tesouro” (como os fãs gritavam para ele ao ser anunciado), é alguém muito especial na história da banda, e sempre será “o guitarrista do Angra”.

Anunciado, o agora ex-membro do Megadeth, entrou no palco ovacionado pela multidão, e tocou, primeiramente, No Pain For The Dead, a amada música do álbum mais mais popular da banda, Temple Of Shadows.

Música difícil, que em geral funciona bem para Fabio Lione, mas, novamente, a voz de Vanessa, fazendo as partes de Sabine Edelsbacher, roubou a cena.

A próxima, também com Kiko nos violões, foi o clássico Holy Land, do álbum homônimo. Essa sim podemos perceber as dificuldades de Rafael ao cantar, agora sem a presença da cantora convidada. De qualquer forma, é uma música que o próprio público canta em massa, ofuscando qualquer vocalista que estivesse cantando e o som do público cantando junto é revigorante em qualquer ocasião.

Público cantando em uníssono foi o que aconteceu também em Late Redemption, tanto nas partes em inglês, e mais ainda mais nas em português, originalmente cantadas pelo astro da MPB Milton Nascimento. Um momento sempre especial!

Faltavam, ainda, alguns hinos da carreira da banda, e foi então que uma das preferidas de todos, a última com Kiko na noite, foi tocada.

Rebirth seguiu à risca o que se esperava, com público emocionado, e um arranjo muito bom acústico, muito parecido, mas com algumas diferenças, do tocado na versão acústica em estúdio no EP Hunters And Prey. Kiko saiu do palco ovacionado!

Já com a banda e orquestra apenas em palco, como começou o show, Bleeding Heart, balada mais famosa da banda — inclusive fora do rock, com o cover da banda de forró Calcinha Preta — foi executada para delírio de todos, em especial dos casais apaixonados. Novamente, uma música que infelizmente é difícil ouvir sem a interpretação do vocalista original Edu Falaschi, por ser tão característica dele.

A banda então saiu do palco e, para surpresa de absolutamente ninguém, retornaram e tocaram o grande clássico Carry On, sem Unfinished Allegro como introdução, como no começo do show.

Música que poderia, e até pode-se dizer que deveria ter ficado de fora, pois se trata de uma música muito rápida e pesada que, assim como Nova Era no começo, não combina com formato acústico.

Já houveram momentos, no início da banda, que faziam versões acústicas experimentais dessa canção, que em geral ficavam muito boas, mas ali tentaram deixar a música reta e direta como originalmente, o que infelizmente não deu certo. Mesmo assim, impossível dizer que o público não se animou, e o refrão foi cantado por todos tão alto, que até esquecemos que era um show acústico.

APESAR DOS PONTOS BAIXOS, SALDO É POSITIVO

Destacados os pontos altos e baixos, no fim dificilmente alguém se arrependeria de ter ido ao evento.

Ver Vanessa cantar magistralmente, ouvir o público cantar refrães e fazer coros e, em especial, ver a presença do lendário ex-guitarrista da banda Kiko Loureiro novamente com eles é algo que não tem preço.

Há de se dizer, também, que o som do contrabaixo acústico tocado por Felipe Andreoli, serviu muito bem, tendo até mais destaque no som que em grande parte dos shows elétricos. As baterias de Bruno Valverde, infelizmente, não tiveram grandes inovações em relação ao padrão elétrico, tirando o menor uso de pedais duplos, muitas vezes sendo ofuscada pela percussão.

Agora, o que resta é esperar que o lançamento do DVD Acústico, gravado em Curitiba ainda em 2023, não demore mais a sair, para que todos possamos assistir e reassistir, ouvir e reouvir esses clássicos em versões acústicas.

O saldo final é positivo, e é muito interessante ouvir um lado mais calmo e tranquilo de músicas de um gênero tão pesado. Apesar disso, é inegável que houveram erros em escolhas de repertório e arranjos, que sem dúvidas serão revistos e consertados para futuros trabalhos do tipo. Capacidade para isso, a banda, seus músicos, têm de sobra!

ANGRA:

Fabio Lione — Vocais

Rafael Bittencourt — Violões/vocais/backing vocals

Marcelo Barbosa — Violões

Felipe Andreoli — Baixo Acústico

Bruno Valverde — Bateria

 

CONVIDADOS:

Kiko Loureiro — Violões/backing vocals

Vanessa Moreno — Vocais

Guga Machado — Percussão

Davi Jardim — Pianos/Teclados

 

SET-LIST:

Nova Era

Make Believe

Storm Of Emotions

Gentle Change

Bottom Of My Soul

Silence And Distance

Reaching Horizons

Hear In The Now

Wuthering Heights

Tears Of Blood

No Pain For The Dead

Holy Land

Late Redemption

Rebirth

Bleeding Heart

Carry On

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